Para várias coisas, sou muito emotiva. Mas no cinema, só me emociono mesmo quando assisto a algum filme que me toque muito profundamente e que me faça passar um longo tempo a pensar sobre a sua história e os sentimentos nela envolvidos. Vinicius, de Miguel Faria Jr, é um filme comovente que me levou (e me tem levado) literalmente às lágrimas nas cinco vezes em que eu o assisti até agora.
“Que seja eterno enquanto dure”: o verso que popularizou Vinicius de Moraes em todo o país, cabe como perfeita epígrafe para o filme de Miguel Faria. O poetinha da paixão, o poeta da tradição, o eterno apaixonado que se casou nove vezes, o boêmio que nunca abandonou o uísque (o seu “cachorro engarrafado”), o diplomata, o jovem autor de poemas metafísicos, o letrista, o crítico de cinema, o desbundado “branco mais preto do Brasil”, o amigo, o pai, o parceiro, o homem.
Vinicius é um documentário que transcende a linguagem fria e distanciada comumente utilizada nesses tipos de filmes. É um filme com alma, tendo a emoção como fio condutor. A grande questão buscada pelo diretor e pela produtora Susana Moraes, filha de Vinicius, foi desconstruir a imagem reducionista do termo “poetinha”, que percorreu durante todo esse longo tempo as escolas, os meios acadêmicos, literários, musicais e até o imaginário popular.
Reproduzindo o ambiente dos pockets-shows dos anos 50, a cena central acontece num pequeno palco com cortinas vermelhas, onde as falas dos atores Camila Morgado e Ricardo Blat, amparadas nos próprios poemas de Vinicius de Moraes, passam ao público (do teatro e do cinema) a trajetória da vida do poeta. É também nesse pequeno palco que acontecem as participações de vários músicos da nova geração, como Martin’ália, Mariana de Moraes, Yamandú Costa, Adriana Calcanhotto, Zeca Pagodinho, Mônica Salmaso e Olivia Byington.
Do nascimento em 1913, à morte relativamente precoce aos 67 anos, em 1980, o filme reconstrói todo o período vivido por Vinicius. A infância, a juventude e a maturidade voltam à cena através de fotos, registros históricos, canções e depoimentos emocionados como os de Ferreira Gullar, Suzana Moraes, Chico Buarque, Edu Lobo, Tônia Carrero e Antonio Cândido.
Recordo-me que em todos os cursos de literatura brasileira de que participei, Vinicius de Moraes era sempre deixado à deriva. Por absoluta falta de espaço na grade curricular, diziam alguns, outros por o considerarem situado numa escala inferior à trindade máxima Drummond/ Bandeira/ Cabral.
Antonio Cândido, um dos mais respeitáveis intelectuais e críticos literários de nosso país, emite sua opinião sobre a poesia de Vinicius que, na verdade, foge muito ao estereótipo daquele “poetinha”, como era chamado: “Vinicius de Moraes é um homem apegado à métrica, um homem apegado à rima, um homem apegado às formas poéticas tradicionais como o soneto, como a ode etc. Portanto, é um poeta que está inserido na tradição. Exatamente por causa dos grandes recursos formais, técnicos, que ele tem, ele se aproximou mais do que nenhum outro daquilo que os modernistas queriam, que é a vida cotidiana, que é a destruição do tema poético nobre, que é a frase coloquial. Ninguém chegou mais perto do que Vinicius da naturalidade. Ninguém chegou mais perto da vida cotidiana, do prosaico, no entanto, dentro de uma poesia da continuidade e da perfeição formal. Um poeta que é autor de poemas como Balada do Mangue, por exemplo, só pode ser considerado um grande poeta”.
São tantas cenas e depoimentos interessantes que infelizmente não cabem neste pequeno espaço do jornal. Take 1: Vinicius totalmente bêbado debruçado nos ombros de Tom Jobim, também completamente bêbado, ambos cantando os lindos versos de “Pela luz dos olhos teus”. Take 2: Vinicius cantando e Baden tocando, ao redor um grupo enorme de jovens. Take 3: Muito uísque, muito cigarro. Um Vinicius já envelhecido e cansado conversa com os filhos Susana e Pedro sobre as mulheres: “Eu acho essa transa que eu tive com as mulheres tão bonita, não tem nada de ruim, elas ficam com uma raiva de mim f... depois que separam. Eu me separo porque eu deixei de gostar delas, pô. A mulher, pra mim, não é um objeto sexual não, a mulher é um troço que eu amo pra c... e dou tudo, o que eu posso fazer?”
Take 4: Chico Buarque define o poeta: Vinicius era uma pessoa que é até difícil de imaginar hoje em dia. Não sei onde estaria Vinicius de Moraes hoje em dia, porque ele é o contrário de muita coisa que hoje é vitoriosa. A ostentação, porque ele tinha essa coisa muito generosa, às vezes ingênua, às vezes porra-louca, uma coisa que não existe mais hoje. Nem a porra-louquice, nem a generosidade, muito menos a ingenuidade. Existe sempre um resultado que se busca, um objetivo, uma coisa pragmática e tal, tudo que Vinicius não era. Vinicius faz muita falta hoje, talvez ele não pudesse mesmo estar vivo sendo Vinicius hoje, não imagino em que lugar ele estaria dentro desse país que a gente vive. Desse país e desse mundo.
“Que seja eterno enquanto dure”: o verso que popularizou Vinicius de Moraes em todo o país, cabe como perfeita epígrafe para o filme de Miguel Faria. O poetinha da paixão, o poeta da tradição, o eterno apaixonado que se casou nove vezes, o boêmio que nunca abandonou o uísque (o seu “cachorro engarrafado”), o diplomata, o jovem autor de poemas metafísicos, o letrista, o crítico de cinema, o desbundado “branco mais preto do Brasil”, o amigo, o pai, o parceiro, o homem.
Vinicius é um documentário que transcende a linguagem fria e distanciada comumente utilizada nesses tipos de filmes. É um filme com alma, tendo a emoção como fio condutor. A grande questão buscada pelo diretor e pela produtora Susana Moraes, filha de Vinicius, foi desconstruir a imagem reducionista do termo “poetinha”, que percorreu durante todo esse longo tempo as escolas, os meios acadêmicos, literários, musicais e até o imaginário popular.
Reproduzindo o ambiente dos pockets-shows dos anos 50, a cena central acontece num pequeno palco com cortinas vermelhas, onde as falas dos atores Camila Morgado e Ricardo Blat, amparadas nos próprios poemas de Vinicius de Moraes, passam ao público (do teatro e do cinema) a trajetória da vida do poeta. É também nesse pequeno palco que acontecem as participações de vários músicos da nova geração, como Martin’ália, Mariana de Moraes, Yamandú Costa, Adriana Calcanhotto, Zeca Pagodinho, Mônica Salmaso e Olivia Byington.
Do nascimento em 1913, à morte relativamente precoce aos 67 anos, em 1980, o filme reconstrói todo o período vivido por Vinicius. A infância, a juventude e a maturidade voltam à cena através de fotos, registros históricos, canções e depoimentos emocionados como os de Ferreira Gullar, Suzana Moraes, Chico Buarque, Edu Lobo, Tônia Carrero e Antonio Cândido.
Recordo-me que em todos os cursos de literatura brasileira de que participei, Vinicius de Moraes era sempre deixado à deriva. Por absoluta falta de espaço na grade curricular, diziam alguns, outros por o considerarem situado numa escala inferior à trindade máxima Drummond/ Bandeira/ Cabral.
Antonio Cândido, um dos mais respeitáveis intelectuais e críticos literários de nosso país, emite sua opinião sobre a poesia de Vinicius que, na verdade, foge muito ao estereótipo daquele “poetinha”, como era chamado: “Vinicius de Moraes é um homem apegado à métrica, um homem apegado à rima, um homem apegado às formas poéticas tradicionais como o soneto, como a ode etc. Portanto, é um poeta que está inserido na tradição. Exatamente por causa dos grandes recursos formais, técnicos, que ele tem, ele se aproximou mais do que nenhum outro daquilo que os modernistas queriam, que é a vida cotidiana, que é a destruição do tema poético nobre, que é a frase coloquial. Ninguém chegou mais perto do que Vinicius da naturalidade. Ninguém chegou mais perto da vida cotidiana, do prosaico, no entanto, dentro de uma poesia da continuidade e da perfeição formal. Um poeta que é autor de poemas como Balada do Mangue, por exemplo, só pode ser considerado um grande poeta”.
São tantas cenas e depoimentos interessantes que infelizmente não cabem neste pequeno espaço do jornal. Take 1: Vinicius totalmente bêbado debruçado nos ombros de Tom Jobim, também completamente bêbado, ambos cantando os lindos versos de “Pela luz dos olhos teus”. Take 2: Vinicius cantando e Baden tocando, ao redor um grupo enorme de jovens. Take 3: Muito uísque, muito cigarro. Um Vinicius já envelhecido e cansado conversa com os filhos Susana e Pedro sobre as mulheres: “Eu acho essa transa que eu tive com as mulheres tão bonita, não tem nada de ruim, elas ficam com uma raiva de mim f... depois que separam. Eu me separo porque eu deixei de gostar delas, pô. A mulher, pra mim, não é um objeto sexual não, a mulher é um troço que eu amo pra c... e dou tudo, o que eu posso fazer?”
Take 4: Chico Buarque define o poeta: Vinicius era uma pessoa que é até difícil de imaginar hoje em dia. Não sei onde estaria Vinicius de Moraes hoje em dia, porque ele é o contrário de muita coisa que hoje é vitoriosa. A ostentação, porque ele tinha essa coisa muito generosa, às vezes ingênua, às vezes porra-louca, uma coisa que não existe mais hoje. Nem a porra-louquice, nem a generosidade, muito menos a ingenuidade. Existe sempre um resultado que se busca, um objetivo, uma coisa pragmática e tal, tudo que Vinicius não era. Vinicius faz muita falta hoje, talvez ele não pudesse mesmo estar vivo sendo Vinicius hoje, não imagino em que lugar ele estaria dentro desse país que a gente vive. Desse país e desse mundo.
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